quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Meus Primeiros Sutiãs

Atenção: esta é uma nova versão da crônica que tinha sido uma de minhas primeiras postagens (em maio de 2011), e agora estou retirando deste espaço.

 Meu primeiro sutiã foi um biquini que eu mesma confeccionei.
 Eu era um garoto de uns 14 ou 15 anos, morria de vontade de me vestir de menina, então montei o biquini recortando o pano de uma velha bandeira do Palmeiras.
 Ao vesti-lo, interliguei as duas peças usando cadarços de tênis que davam algumas voltas ao redor de meus ombros, costas e cintura, sendo arrematados por lacinhos e alcinhas. Graças a este último detalhe, fiquei bastante sensual.
 Essa foi a única vez em que demonstrei ter talento como estilista de moda. Ou seja, meus dotes femininos eram tanto de modelo como de costureira.
 Devo acrescentar que a bandeira era de um tom de verde muito bonito, feito de um tecido sedoso que se adaptou bem confortavelmente às minhas partes íntimas (que, na época, ainda não eram nem seios nem xoxota).
 Eu vestia esse biquini e ficava me admirando ao espelho nos fins-de-semana em que meus pais viajavam.
 Para completar a caracterização passava batom, e às vezes rouge, nos lábios e rosto. Nas orelhas, brincos que fabriquei usando minha coleção de chaveiros.
 Meu cabelo era comprido, e tentei ajeitá-lo de uma forma feminina. Infelizmente, como cabeleireira não fui tão talentosa quanto a costureira, só obtendo algum êxito quando aprendi a fazer um par de marias-chiquinhas.
 Uma vez, lembrei-me de um par de sandálias de salto alto que minha irmã costumava usar em seus tempos de patricinha. Procurei no armário, mas infelizmente não os achei, e até hoje não realizei o desejo de calçar saltos altos de mulher. O que achei no guarda-roupa dela, em compensação, foram alguns vestidos e saias, tanto de patricinha como de riponga. Usei todos eles.
 Antes de criar o biquini, eu já me vestia de mulher, mas dispunha apenas de sutiãs, meias-calças e combinaçôes que ia buscar no cesto de roupa suja, e não podia chamar de meus. Portanto, meu primeiro sutiã foi o biquini alviverde - para todos os efeitos, minha iniciação como travesti.
 E dou razão à propaganda da Valisère (que na época ainda não fora veiculada): o primeiro sutiã a gente nunca esquece.
 Na época de meu primeiro sutiã eu não tinha consciencia, como tenho hoje, de pertencer ao sexo feminino. Era obrigada a fazer tudo isso às escondidas, e fui uma garota infeliz, sem saber direito por que. Percebia que era infeliz sem perceber que era garota (achava que era bicha).
 Somente muitos anos depois (décadas, para ser mais exata) é que me entendi como menina. Tinha o costume de cumprimentar minhas amigas todo dia 8 de março (Dia Internacional da Mulher) até que num certo ano, nessa data, decidi que a homenageada seria eu.
 Nesse dia, fiz-me mulher. E adquiri meu segundo sutiã.
 (A campanha publicitaria da Valisère já existia)

 Fui às Lojas Americanas e, vencendo minha vergonha, examinei, um tanto apressada, a seção de lingerie. Sem falar com ninguém, escolhi um sutiã e uma calcinha, ambos de lycra preta, e levei direto para o(a) caixa, onde felizmente ninguém me perguntou nada ou fez qualquer comentário. Portanto, meu segundo sutiã tambem foi um biquini, o que fez a diferença: eu iria, pela primeira vez, vestir uma verdadeira calcinha de mulher.
 Em casa, ao vestir as peças, senti a diferenca entre uma verdadeira lingerie e as nada sexys peças de algodão que eu roubava do cesto de mamãe. O tecido de lycra preta me deixava tão sensual quanto os lacinhos e alcinhas que eu mesma confeccionara décadas antes. O sutiã conseguia a proeza de "realçar" um peitinho que, na verdade, inexistia por completo, alem de me presentear com mais algumas curvas! E até minha bundinha ficou sexy, com o tecido e o corte da calcinha proporcionando um contraste provocante!
 
 Peitinho, bundinha... completei a maquiagem, mais os brincos, e fiquei uma tremenda gata! Linda, graciosa, um amor de garota! Eu já era travesti (entre quatro paredes) desde a época do biquini alviverde, mas agora entendi o que é ser feminina!
 Naquele mesma noite (era um sábado) saí à rua usando a lingerie por baixo das roupas normais (masculinas). Até rebolei um pouco enquanto andava na rua, para melhor sentir a sensualidade das minhas "curvas" recém-adquiridas... ou seja, estava dando bola, mostrando como sou gostosinha... de certa forma rompi o limite das citadas quatro paredes.

 (Mas ninguém percebeu)

 Assim, vestida de mulher, assisti a uma sessão de cinema. Prestava atenção no filme, mas não deixava de lembrar que estava vestida de mulher, o que me deixava bem excitadinha. Terminado o filme, ocorreu uma cena engraçada: fui ao banheiro do cinema (dos homens) e, em frente ao mictório, abri a calça para urinar. Ao meu lado havia outro sujeito urinando, e me diverti bastante imaginando que, se ele desse uma olhadela para o lado, veria minha calcinha, percebendo que eu era uma boneca! Eu devia estar muito piradinha essa noite, pois não fiquei nem um pouco constrangida! 
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 Depois do segundo sutiã, nao tive mais nenhum. Os relatos que narrei foram, até agora, minhas tentativas mais bem sucedidas de me vestir de mulher. De lá para cá o máximo que faço, às vezes, é inverter camisetas velhas e vesti-las como se fossem saias ou vestidos - estes ultimos são sempre "pretinhos", mas não são nenhum fenomeno de sensualidade, embora às vezes consigam insinuar estar semi-encobrindo virtuais seios.
Obviamente, nao tive a adolescencia que se deseja para um menino. Em vez de passar de menino a homem, virei uma menina. A bandeira do Palmeiras que vira biquini é emblemática: equivale a substituir a bola de futebol pelas bonecas.
Nunca brinquei, nem nunca quis brincar, com bonecas... mas acabei me tornando uma!
 
"Ainda não desabrochei, mas já me assumi como flor."
 
Débora Lygia
crônica de dezembro de 2008
revisada em dezembro 2012
 

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